A importância do orçamento público pode ser avaliada por diversas dimensões: histórica, democrática, de gestão, entre outras. Porém, de um ponto de vista prático, o orçamento é importante porque, sem ele, a Administração Pública fica quase completamente impedida de agir. Num país com tantas regras e exceções, uma coisa é certa: não existe despesa orçamentária sem prévia autorização legislativa (exceto, aquelas realizadas por meio de créditos extraordinários, destinados a despesas urgentes e imprevistas, em caso de guerra, comoção intestina ou calamidade pública. Tais créditos são abertos por decreto do Poder Executivo, que deles dará imediato conhecimento ao Poder Legislativo.
Por essa razão, não basta lei instituindo programas, não basta servidores competentes em suas áreas de atuação, não basta nem sequer ter dinheiro no caixa. É preciso ter autorização para gastá-lo, e o orçamento público representa, justamente, essa autorização.
É importante então que o gestor reconheça a relevância do orçamento público, porque o desrespeito às suas regras pode ser punido penal, civil, administrativa e politicamente, constituindo inclusive crime de responsabilidade. Portanto, vale a pena explorar um pouco mais o que é e como funciona o orçamento público.
O que é o orçamento público
O orçamento público no Brasil é materializado na Lei Orçamentária Anual (LOA), que relaciona todas as receitas que o ente espera arrecadar, e também todas as despesas que o ente está autorizado a realizar. Evidentemente, essa “grande tabela” classifica todos esses valores de diversas formas, trazendo coerência e transparência à ação governamental.
Em relação às receitas, por exemplo:
- De onde virão essas receitas?
- De tributos, de empréstimos, de atividades econômicas empreendidas pelo ente, transferências constitucionais ou voluntárias recebidas etc;
- Essas receitas estão vinculadas a alguma finalidade?
- As Receitas podem ter vinculação com determinada despesa específica ou não. Receitas fruto de impostos são de livre aplicação, respeitando as aplicações mínimas constitucionais de 25% na educação, e 15% na saúde, Por outro lado, existem receitas que são oriundas de transferências e tratam de recursos vinculados à saúde, à educação, ou qualquer outra despesa específica. Importante destacar que as receitas de capital só podem ser utilizadas com despesas de capital.
Em relação às despesas, por exemplo:
- Em qual área da atuação estatal?
- Saúde, educação, assistência social, segurança pública, previdência social etc;
- Qual órgão será responsável pela receita?
- Secretaria municipal de saúde, secretaria municipal de cultura, secretaria municipal de infraestrutura, uma autarquia ou fundação municipal etc;
- Que tipo de objeto será adquirido ou contratado?
- Despesas de pessoal, investimentos, juros da dívida etc;
- Em qual programa essa despesa será realizada?
- Manutenção e operação de escolas municipais de educação infantil; capacitação, formação e aperfeiçoamento de servidores; pavimentação e recapeamento de ruas etc.
Em especial, esta última classificação do orçamento – a programática – viabiliza a ligação entre planejamento e orçamento.
Durante o primeiro ano de mandato, os prefeitos devem elaborar seu Plano Plurianual (PPA), um instrumento de planejamento no qual constarão diretrizes e programas de governo. Por sua vez, o orçamento público (LOA) especificará, para cada ano, quanto será gasto em cada programa, e de onde virão os recursos para financiá-los. No meio de campo entre PPA e LOA, temos a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), uma lei anual que regulamenta aspectos da elaboração e execução do orçamento público.
Necessidade de planejamento na Administração Municipal
Conforme a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF, Lei Complementar nº101, de 2000), “a responsabilidade na gestão fiscal pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas”. Num contexto histórico, o projeto da LRF foi apresentado em 1999, como uma das iniciativas do Programa de Estabilidade Fiscal (PEF), tendo como objetivo “a drástica e veloz redução do déficit público e a estabilização do montante da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB)”.
É verdade que a Constituição Federal já havia trazido diversos dispositivos que indicam a necessidade do planejamento. O Art.165 prevê a elaboração do PPA, LDO, e LOA, e o Art.167 veda o início de programas e projetos e a realização de despesas que não estejam cobertos pelo orçamento público. Porém, a LRF expandiu bastante o papel desses instrumentos, exigindo que:
- a LDO traga avaliação do desempenho fiscal de anos anteriores e projeções para os seguintes, além de metas de resultado primário e nominal;
- a renúncia de receita ou a criação de despesa demonstrem sua compatibilidade com as metas, e indiquem as compensações ou fontes de recursos;
- o ente monitore e mantenha sua despesa com pessoal e endividamento abaixo de limites específicos.
Além disso, tais projeções devem ser instruídas “com memória e metodologia de cálculo que justifiquem os resultados pretendidos”, com o objetivo de trazer maior consistência às contas públicas. Entre essas informações, podemos citar:
- projeção para o crescimento econômico (nacional, regional e/ou local),
- especialmente no ramo de serviços, que afeta a arrecadação do Imposto Sobre Serviços (ISS),
- mas também industrial e de comércio, que afeta o repasse de Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e prestação de Serviços de transporte e comunicação (ICMS);
- projeção da inflação, assim como atualizações monetárias sobre a base de cálculo do Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana (IPTU);
- crescimento da frota de veículos, que influencia o repasse do imposto sobre propriedade de veículos automotores (IPVA);
- outras mudanças com impacto na arrecadação, como a Constitucional 108/20, que recentemente alterou do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação – Fundeb;
- entre outras.
O sistema orçamentário brasileiro
Por fim, um tema que vem ganhando maior relevância no cenário nacional é a natureza do orçamento público. Via de regra, o orçamento é um peça autorizativa – ou seja, permite que o administrador público realize despesas. Por outro lado, com a Emenda Constitucional nº 86 (2015), 100 e 105 (2019), parte do orçamento público na esfera federal passou a ter caráter impositivo – ou seja, obrigando o administrador público a realizar as despesas. Trata-se das emendas individuais e de bancada.
Esse mecanismo ocorre num sistema misto de elaboração de orçamentos: a iniciativa do projeto de lei orçamentária é do Poder Executivo, mas cabe ao Poder Legislativo aprová-la. Nesse processo, como o projeto pode receber diversas emendas – desde que compatíveis com a LDO e demais normas. Não poderia a Câmara, por exemplo, introduzir emendas alheias ao tema, como, por exemplo, um reajuste salarial a determinada categoria de servidores.
No entanto, para que a parte impositiva do orçamento passe a valer no âmbito municipal, é preciso incorporá-la nas leis orgânicas ou, no mínimo, nas leis de diretrizes orçamentárias. Além disso, os limites de imposição não podem, a princípio, superar aqueles previstos na Constituição, conforme liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6308.
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