No primeiro post sobre problemas na condução de projetos complexos de desenvolvimento, vimos que intervenções que (a) reproduzem soluções externas, (b) são executadas por processos lineares, (c) têm alta aderência aos planos iniciais do projeto e (d) são implementadas de cima para baixo (top-down), normalmente apresentam uma baixa probabilidade de sucesso. Para evitar esta armadilha em projetos complexos de desenvolvimento, os pesquisadores Matt Andrews, Lant Pritchett e Michael Woolcock da Harvard Kennedy School sugerem quatro dicas simples que, se adotadas, aumentam significativamente a chance de sucesso de tais projetos.
A primeira delas tem a ver com resolver problemas específicos da localidade e não problemas “impostos” por correntes dominantes do pensamento em torno dos problemas que regiões enfrentam. Por exemplo, atualmente, questões de ajustamento fiscal dominam a agenda de projetos. Projetos de melhoria fiscal acabam sendo foco para destravar o desenvolvimento mesmo em situações em que os gargalos são outros, simplesmente pelo fato deste tópico ser o foco do momento. Para evitar este tipo de engajamento em temas que não são prioritários, é importante que a localidade (administração municipal, consórcio regional, estado e outros) desenvolva a capacidade de realizar bons diagnósticos de problemas. O diagnóstico dos reais problemas é uma etapa fundamental para todas as seguintes, sendo crítica a utilização de dados e estatísticas, a realização de conversas/entrevistas com as pessoas que tem relação próxima com o problema e a investigação de dados e informações utilizando técnicas como consulta à população, “5 porquês”, Diagrama de Ishikawa e outras.
Também é importante criar um ambiente seguro e com capacidade de tomada de decisão para encorajar processos de inovação na busca de uma solução para o problema complexo a ser tratado. Problemas complexos não são resolvidos por soluções simples e facilmente encontradas. Em função disto, é necessário criar um ambiente onde os tomadores de decisão possam pensar “fora da caixa”. A experiência de se resolver um problema complexo é parecida com a de se dar pequenos passos com certo grau de insegurança em direção à resolução. A medida que os passos se provarem corretos, devem ser assegurados. Contudo, os que não deram certo, deverão ser revertidos, pois caminharam em direção oposta à resolução do problema. É um processo incremental que deve ter como suporte um ambiente de inovação e aprovação das lideranças.
Um terceiro item crítico, que vale a pena ser mencionado, é a utilização de ciclos curtos de avaliação das medidas inovadoras realizadas para resolução de tal problema complexo. Como há inovação, é crucial entender se os passos dados em direção ao problema estão de fato no caminho certo de resolvê-lo. Os autores de tal metodologia chamam estes ciclos curtos de avaliação de iterações. Durante esta etapa de avaliação é necessário aprender de maneira ativa os erros e acertos, para que estes informem os novos passos a serem dados. Os erros ajustarão as próximas ações no sentido de resolver o problema enquanto os acertos servem como avanços e aprendizados para resolução e também motivam a equipe engajada. Ambos, acertos e erros, acabam sendo positivos e devem ser incorporados na resolução do problema. Aqui cabe uma diferenciação de processos de avaliação complexos como Experimentos Aleatórios, pois os ciclos curtos de avaliação são iniciativas mais simples e práticas aplicadas a contextos reais de resolução do problema.
Por último e não menos importante, é positivo e recomendado o envolvimento de diversos atores com conhecimentos distintos para resolução de problemas complexos. A primeira justificativa para isto é que, envolvendo profissionais com diferentes tipos de conhecimento, o entendimento do problema e suas potenciais fica mais completo, pois é construído em cima de uma base de conhecimento mais ampla. Além disto, trazendo para discussões representantes de diferentes níveis hierárquicos, como por exemplo o envolvimento de profissionais da linha de frente (nível de rua) de implementação de políticas públicas, traz uma outra visão para a situação analisada. Por exemplo, a visão de um problema em uma política de saúde para um médico que tem 100% das suas atividades dentro de um hospital pode ser muito diferente da visão de um secretário de saúde que não passa mais de 10% de suas horas diárias de trabalho em um hospital. Um outro fator a ser mencionado é o ganho de legitimidade de se envolver representantes de diversas esferas que tem relação com o problema a ser resolvido. Este ganho de legitimidade é, muita vezes, fundamental para o entendimento do problema e execução de ações para resolvê-lo. Por exemplo, por mais que corretas, ações para resolver um problema de educação tem um maior risco de fracasso caso não sejam discutidas e validadas juntamente com professores de uma rede.
A resolução de problemas complexos não é um processo simples e requer uma atuação inovadora para aumentar as chances de sucesso. Os pesquisadores de Harvard têm adotado estas quatro dicas mencionadas e, como consequência, obtido maiores taxas de sucesso na implementação de mudanças estruturais. Aqui na Muove Brasil, sempre nos valemos das considerações expostas nas intervenções junto a municípios e acreditamos que estas têm nos ajudado a realizar as transformações necessárias junto aos municípios.